Psicanalista Tássia Borges analisa o que é popularmente chamado de “Síndrome de Rebecca”, o ciúme pelo passado amoroso do companheiro ou companheira. Para ela, isto não se dá apenas no campo do amor, mas em outros tipos de relacionamento, inclusive profissional |

No romance “Rebecca”, da escritora Daphne du Maurier, publicado em 1938 e que também foi adaptado para o cinema por Alfred Hitchcock em 1940, a protagonista é atormentada pela memória da primeira esposa de seu marido, já falecida, chamada Rebeca. Apesar de não estar fisicamente presente, sua influência e a idealização de sua imagem criam um ambiente de constante comparação e insegurança para a nova esposa.
Situações assim não acontecem apenas nas obras de ficção. É por isto que tem se falado muito sobre a “Síndrome de Rebecca”, um tipo específico de ciúmes que surge em relação ao passado amoroso do (a) parceiro (a). “Nessa dinâmica, o indivíduo sente-se ameaçado ou desconfortável com relações que já se encerraram, mesmo que elas não apresentem qualquer interferência no relacionamento atual. É um tipo de ciúmes que pode gerar um intenso sofrimento emocional, comprometendo a autoestima e a qualidade da relação”, explica a psicanalista Tássia Borges.
Com base em sua experiência clínica, a psicanalista afirma que isso não se dá apenas no âmbito do relacionamento amoroso. “Vejo isso acontecer em outros relacionamentos também, em relação a colegas de trabalho, chefes, amigos ou ex-amigos”, ilustra. “Inicia-se um processo de obsessão e fixação que leva a pessoa que sente o ciúme a considerar essas figuras do passado verdadeiras inimigas. Sofrem por uma concorrência que não existe e que é completamente fantasiosa, como se fosse uma assombração”.
As consequências podem ser variadas. Vão da perda de tempo “stalkeando” estas pessoas, passando pela comparação a fim de “superá-las”, até chegar a um quadro de angústia intensa. “O passado do outro – seja do cônjuge, do amigo ou do colega de trabalho – assim como o de todos nós, não pode ser visto como uma ameaça, mas sim, como algo que faz parte da nossa história”, adverte Tássia. “Num processo analítico, apoiado em dados de realidade e não em fantasias, será possível elaborar inseguranças e idealizações. Se isto não for feito, o relacionamento atual pode ser afetado, causando ainda mais sofrimento”.
Sobre Tássia Borges
Tássia Borges é especialista em assuntos relacionados à saúde mental e o psiquismo – entre eles ansiedade, narcisismo, questões geracionais, de relacionamento, luto, solidão e entraves psíquicos que podem impedir atletas de atingir altas performances.
Mestre em Psicologia Clínica pelo Núcleo de Método Psicanalítico e Formações da Cultura da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e Bacharel em Letras pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP), ela trabalha com educação e linguagem há mais de 20 anos. Fundou e dirige o Instituto Kleiniano de Psicanálise, cuja missão é compartilhar de modo responsável e especializado os conhecimentos técnico-teóricos da psicanalista austríaca Melanie Klein (1882-1960) bem como de autores que dialogam com seu pensamento.
Há quase 15 anos, Tássia atua como psicanalista, supervisora e professora não só no IKP, mas em diversas outras escolas de psicanálise em São Paulo e outros estados. Possui formação em psicanálise freudiana e conhecimento das escolas inglesa e francesa. É coordenadora de Psicanálise do GEPECH – Grupo de Estudos e Pesquisa em Comportamento Humano – que tem por objetivo desenvolver conhecimento e pesquisa a partir de estudos transdisciplinares envolvendo neurociência e psicanálise, sobretudo neo-kleiniana.